Creatina: Como Usar Para Fortalecer Músculos à Medida que Envelhecemos

O papel da creatina na manutenção da massa magra e na prevenção da perda de força durante o envelhecimento

Manter força e massa muscular com o avanço da idade é decisivo para preservar autonomia, prevenir quedas e garantir qualidade de vida. Entre as estratégias estudadas pela ciência, a creatina se destaca pela solidez das evidências que confirmam sua eficácia e segurança quando combinada a um programa consistente de treinamento de força.

O que é creatina e como ela atua no organismo

A creatina é uma substância essencial para a produção rápida de energia nos músculos e no cérebro. Ela funciona como uma espécie de reserva energética que o organismo utiliza durante esforços intensos e de curta duração, como levantar peso ou realizar movimentos que exigem força explosiva.

1. Creatina produzida pelo corpo

O organismo fabrica creatina todos os dias por meio de reações que ocorrem principalmente no fígado, nos rins e no pâncreas. Para isso, utiliza aminoácidos que já estão presentes na alimentação: glicina, arginina e metionina. A maior parte da creatina produzida internamente é enviada para o tecido muscular, onde atua como combustível imediato para a contração muscular.

A síntese interna supre aproximadamente metade da necessidade diária, que gira em torno de dois gramas por dia. O restante costuma vir da alimentação.

2. Creatina obtida pela dieta

Os alimentos com maior quantidade de creatina são carnes vermelhas e peixes. Pessoas que consomem esses alimentos regularmente costumam ingerir cerca de um grama de creatina por dia. Já vegetarianos e veganos apresentam valores inferiores, devido à ausência de fontes animais na dieta. Isso não significa menor resposta ao suplemento. Pelo contrário, esses grupos costumam apresentar aumento proporcionalmente maior nos estoques musculares quando suplementam, porque partem de níveis basais mais baixos.

3. Creatina em forma de suplemento

Os suplementos utilizam principalmente creatina monoidratada, forma mais estudada e com melhor relação entre eficácia, segurança e custo. Quando ingerida em pó ou cápsulas, a creatina é absorvida pelo intestino, levada ao sangue e armazenada nos músculos. A suplementação permite elevar os estoques musculares a níveis acima dos que a dieta e a síntese interna conseguem alcançar. Essa saturação aumenta a capacidade dos músculos de realizar treinos intensos e repetitivos, o que favorece o ganho de força e massa magra.

→ Importante destacar: creatina isolada, sem exercício, tende a não oferecer benefícios significativos para massa ou força. Creatina atrasa a fadiga muscular, permitindo treinos mais longos e intensos. É essa maior carga de treino que gera hipertrofia e ganhos de força, não apenas a pílula em si.

O que as pesquisas mostram em adultos mais velhos

Nos últimos anos, diversos ensaios clínicos reforçaram a eficácia da creatina em idosos. Ao combinar treinamento de resistência 2 a 3 vezes por semana com suplementação diária de 3 a 5 g, participantes apresentaram:

• 1,4 kg adicionais de massa magra, em média, após quatro meses, comparado ao placebo;

• aumento de força em exercícios como leg press e supino;

• melhora em testes funcionais, como o sit-to-stand, relacionado ao risco de quedas;

• manutenção parcial dos ganhos por até 12 semanas após interromper o suplemento, desde que o treino fosse mantido.

Há também evidências promissoras em populações com maior fragilidade muscular, como idosos com sarcopenia, sugerindo melhora da funcionalidade e da independência.

Dosagem, protocolo e momento ideal

Para atingir a saturação muscular, há duas abordagens conhecidas:

1. Protocolo lento (o mais prático):

3 g por dia continuamente.

Atinge o mesmo nível de saturação da fase de carga, porém sem picos e com maior conforto gastrointestinal.

2. Protocolo de carga:

20 g por dia divididos ao longo de uma semana, seguido de dose de manutenção.

Usado em atletas, mas não é necessário para adultos mais velhos.

A literatura também avalia o momento de consumo: algumas pesquisas sugerem que tomar creatina logo após o treino pode gerar leve vantagem, embora a diferença ainda não seja conclusiva.

Segurança e efeitos colaterais

Entre todos os suplementos esportivos, a creatina está entre os mais estudados e com melhor histórico de segurança quando utilizada nas doses recomendadas. O efeito colateral mais comum é o aumento discreto de peso, decorrente de retenção de água dentro das células musculares.

Sobre a saúde renal, o principal ponto de confusão é o aumento da creatinina, marcador utilizado em exames de sangue. Como creatinina é produto da quebra da creatina, sua elevação na suplementação pode não indicar lesão renal, mas apenas maior disponibilidade da molécula.

Para pacientes com histórico renal ou dúvidas diagnósticas, médicos podem solicitar marcadores alternativos, como a cistatina C, que não sofre interferência do suplemento.

Pureza e contaminantes

Por não serem regulados com a mesma rigidez que medicamentos, suplementos podem apresentar variações de qualidade. Análises independentes já encontraram lotes com contaminantes acima do recomendado, o que reforça a importância de escolher produtos certificados por órgãos como:

• ANVISA 

• ABENUTRI 

Esses órgãos garantem ausência de substâncias proibidas e padrões de pureza adequados.

Por que é difícil obter creatina suficiente só com a alimentação

Para consumir 3 g de creatina exclusivamente via dieta, seria necessário ingerir quantidades muito elevadas de carne, algo pouco realista para a maioria das pessoas, especialmente considerando:

• aumento de consumo calórico;

• formação de compostos potencialmente prejudiciais no cozimento, como aminas heterocíclicas;

• impacto ambiental e ético do consumo excessivo de carnes.

Além disso, o cérebro mantém seu próprio controle de creatina, independentemente da ingesta alimentar, uma mudança na dieta afeta mais o músculo do que o sistema nervoso central.

Creatina, homocisteína e vitamina B12: uma relação importante em dietas vegetais

A produção interna de creatina utiliza processos metabólicos que liberam homocisteína, molécula que, quando elevada, está associada a maior risco cardiovascular. O organismo neutraliza esse composto usando vitaminas B6, B12 e folato.

Em vegetarianos e veganos, a deficiência de vitamina B12 é comum quando não há suplementação adequada. Isso pode contribuir para aumento da homocisteína.

Recomendações práticas:

• Combine a creatina com treino resistido (2 a 3x por semana) para maximizar os benefícios.

• Use cerca de 3 g por dia para manter a saturação muscular de forma estável.

• Mantenha a suplementação por, pelo menos, 12 semanas junto com o treinamento para ver resultados consistentes.

• Consulte um médico antes de começar, especialmente se tiver histórico renal.

• Escolha produtos de creatina com alta pureza e certificados por testes independentes.

• Suplementar B12, com doses como 50 mcg ao dia ou 2.000 mcg uma vez por semana.

A creatina não é uma solução mágica. Ainda assim, é uma das estratégias mais bem estudadas, seguras e eficazes para preservar massa muscular, ampliar força e melhorar a funcionalidade em adultos mais velhos. Quando aliada ao treinamento de força, torna se uma ferramenta valiosa para promover independência, reduzir risco de quedas e favorecer um envelhecimento mais ativo e saudável.


Fontes:

Gualano, B., Rawson, E.S., Candow, D.G. et al. Creatine supplementation in the aging population: effects on skeletal muscle, bone and brain. Amino Acids 48, 1793–1805 (2016). 
https://doi.org/10.1007/s00726-016-2239-7

Chilibeck PD, Kaviani M, Candow DG, Zello GA. Effect of creatine supplementation during resistance training on lean tissue mass and muscular strength in older adults: a meta-analysis. Open Access J Sports Med. 2017 Nov 2;8:213-226.
https://doi.org/10.2147/OAJSM.S123529

Yazigi Solis M, de Salles Painelli V, Giannini Artioli G, Roschel H, Concepción Otaduy M, Gualano B. Brain creatine depletion in vegetarians? A cross-sectional 1H-magnetic resonance spectroscopy (1H-MRS) study. British Journal of Nutrition. 2014;111(7):1272-1274.
https://doi.org/10.1017/S0007114513003802

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